COPENHAGA, de Michael Frayn, encenada por João Lourenço, Teatro Aberto (2005)
COPENHAGA, de Michael Frayn, encenação de João Lourenço (2005), Teatro Aberto
A acção da peça “Copenhaga”, do dramaturgo alemão Michael Frayn, passa-se em 1941, na capital da Dinamarca, quando o nazismo estava ainda longe de ser derrotado, e o país havia sido ocupado pelos nazis, como grande parte da Europa.
Os personagens da peça são: o físico dinamarquês Niels Bohr (1885-1962) (Luís Alberto) e sua mulher Margrethe Bohr (1890-1984) (Carmen Dolores). O físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976) (Paulo Pires). Três magníficas interpretações de dois grandes actores veteranos e de um novo que se afirma, de trabalho para trabalho, como um dos melhores da sua geração. Peça interessantíssima, com uma força dramática que prende irresistivelmente o espectador. Encenação que não desmerece do conjunto, bem pelo contrário, ajudada pela concepção do espaço criado, que resulta particularmente para um texto que não se pode perder.
O tema da peça centra-se na visita que Heisenberg fez em 41 ao seu antigo mestre e amigo Bohr, em Copenhaga, durante a ocupação nazi, e na especulação sobre as verdadeiras razões dessa visita, de que o autor apresenta várias versões. Talvez a mais plausível seja que se tratou de uma tentativa de Heisenberg, que continuava a trabalhar na Alemanha, na investigação sobre a energia nuclear e na sua eventual utilização nas armas de destruição maciça, esclarecer dúvidas sobre essa investigação, o que Bohr obviamente recusou.
A peça põe pois o problema da investigação científica e do aproveitamento político dela, para fins criminosos.
Bohr toma claramente uma posição anti-fascista e foge em 43 para a América do Norte, antes que os nazis o prendam. A posição de Heisenberg é ambígua, embora tente insinuar (depois da derrota) que de certo modo travou a construção da bomba atómica pelos alemães. Sendo dois cérebros privilegiados da investigação científica, com desenvolvimentos importantíssimos para o avanço da ciência, a sua posição como cidadãos acaba por fazer parte da apreciação que a história faz e fará deles.
Nesse aspecto um dos aspectos mais interessantes da peça é relembrar-nos que a Dinamarca protegeu “os seus judeus”, fazendo-os fugir e escapar à tortura e à morte nos fornos crematórios alemães. Vivendo nós num país de, infelizmente, horríveis tradições nesse aspecto – a Inquisição da Igreja Católica Apostólica Romana, com os seus milhares de mortos na fogueiras, e a colaboração de Salazar com os nazis – o exemplo da dignidade de certos povos não devia deixar de nos impressionar.
Devemos ainda lembrar que Bohr, contra vontade ou não, porque se assumia como pacifista, acabou no entanto por colaborar com os norte-americanos. E a bomba atómica acabou por surgir. Tendo os norte-americanos num acto injustificável, cedendo à paranóia dos militares ultras, que queriam experimentar a bomba e simultaneamente ameaçar a União Soviética, acabam por lançar duas sobre o Japão derrotado, causando milhares de vítimas civis, num verdadeiro crime contra a Humanidade.
Notas biográficas das personagens principais da peça:
Niels Bohr foi o físico dinamarquês, de ascendência judaica, prémio Nobel em 1922. Em 1913 apresentou uma teoria fundamental para a explicação da estrutura dos átomos; o chamado modelo atómico de Bohr, permitiu explicar por que é que um átomo só emite luz de determinados comprimentos de onda. No outono de 1943 foi obrigado a fugir do seu país natal, para escapar à perseguição nazi, em circunstâncias dramáticas. Refugiado nos EUA colaborou nos trabalhos que levaram à produção da primeira bomba atómica (1943-45).
Werner Heisenberg (1901-1976), físico alemão, um dos fundadores da mecânica quântica. Foi prémio Nobel em 1932. Permaneceu na Alemanha durante o período nazi. Foi em relação aos seus estudos que enunciou os seus famosos princípios de incerteza: quanto maior é o rigor com que é conhecida a posição de uma partícula atómica, tanto menor é a precisão com que se pode determinar a sua energia (ou momento) e vice-versa: quanto maior é o rigor com que se determina a energia de uma partícula, tanto menor é a precisão com que se conhece o instante em que ela possui essa energia e vice-versa.
A mecânica quântica substituiu a mecânica clássica, Newtoniana, para o comportamento das partículas de muito pequena dimensão (na estrutura atómica). Constitui uma teoria física geral válida para as grandezas tão pequenas que dificilmente poderão ser observadas directamente com os instrumentos laboratoriais. Segundo Heisenberg (1925) não podemos fixar sem ambiguidade a posição e velocidade de átomos e electrões, por exemplo, mas apenas considerar probabilidades maiores ou menores para os valores dessas grandezas. Para isso elaborou-se um método matemático especial. Parte importante da mecânica quântica é a mecânica ondulatória, cujo desenvolvimento se deve principalmente a De Broglie e Schrödinger e em que se associa a cada partícula em movimento uma espécie de onda periódica.
Niels Bohr aplicou a ideia dos quanta (1913) à teoria dos espectros atómicos no seu modelo do átomo, o átomo de Bohr.
De salientar que, já em 1905, Albert Einstein para explicar certos resultados obtidos no estudo do efeito fotoeléctricos, considerou a luz (radiação electromagnética) como constituída por grânulos de energia, cada um deles com um quantum de energia. A esses grânulos de luz chamou fotões.
(Teatro aberto, 24-Abr-2005)
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